28 julho, 2003

29 DE JULHO DE 2002

Come Rain Or Come Shine

Text & Music
Harold Arlen & Johnny Mercer

I‘m gonna love you, like nobody‘s loved you
Come rain or come shine
High as a mountain, deep as a river
Come rain or come shine
I guess when you met me
It was just one of those things
But don‘t you ever bet me
‚Cause I‘m gonna be true if you let me
You‘re gonna love me, like nobody‘s loved me
Come rain or come shine
We‘ll be happy together, unhappy together
Now won‘t that be just fine
The days may be cloudy or sunny
We‘re in or out of the money
But I‘m with you always
I‘m with you rain or shine

Onde eu me encontrei



Sim, foi em Copacabana. Mais precisamente no dia 29 de julho de 2002. A história, é longa e só vale contar pessoalmente – mas nem pelo fato de ser longa é chata ou desinteressante. Só sei que termina (ou começa) com um telefonema, em que se ouve Come rain or come shine na voz de Al Jarreau. E entra a minha voz, e começamos a conversar. O tempo parece ter parado de vez, a gente nem pensa mais nada. É pouco mais de meia-noite, início do dia 28 de julho, a conversa e as declarações ainda tímidas de amor vão até quatro e meia da manhã. Nos despedimos com a promessa de voltarmos a nos falar durante o dia – para variar, eu estava de plantão.
No dia seguinte, eu ligo e digo, “estou saindo, de táxi”. Entro na rua dela e a cada número até chegar ao 41 o coração parece aumentar o ritmo. Vejo a moça, é ela, que vem, entra silenciosa no táxi, nos beijamos imediatamente. Peço ao motorista para ir até Ipanema – na época, o Shenanigan’s ainda estava transitável.
No rádio do táxi, “I don’t wanna talk about it”, com Rod Stewart. E a gente se beijando.
Ela me dá o CD “Are you passionate?”, do Neil Young, repetindo o que eu escrevera meses atrás, “garantia de um bom começo”. E foi.
Já no Shenaningan’s brindamos com vinho, e passamos a noite nos beijando.
No dia 29 de julho de 2002, um ano atrás, essa história começava assim.
O Niezstche dizia que era necessário afundar na angústia do caos para engendrar estrelas. Pois eu acho que no fundo Marcele é a estrela que o meu caos engendrou. O meu caos e o nosso acaso. Marcele é, para mim, o meu acreditar eterno em final feliz – sim, pois não é ela a própria personificação de tudo isso?
Depois de algumas “topadas”, alguns tiros n’água, outras rejeições, certas decepções e muitas noites que terminei ouvindo “No surprises”, do Radiohead, Marcele me fez usar de novo a palavra amor – que eu sempre costumei definir como uma mistura caótica de sonhos e hormônios. Só quem já foi no fundo do poço pode entender de verdade o que é Marcele para mim – é como torcer por um time médio do interior, você nunca acha que vai ver seu time ganhar títulos, de repente ganha, e a ficha passa anos sem cair.
Marcele é quando eu engulo a ficha.
“Nossa vida juntos vai ser um sonho”, ela me disse. E até hoje repetimos, está sendo um sonho, está sendo um sonho.
No momento por que passo, com uma hérnia de disco, ela está me ajudando a não enlouquecer. Sua paciência é enorme, e seu amor, infinito.
No ano que passei antes de encontrar Marcele, eu tinha me preparado para uma vida sozinho. E me sentia razoavelmente bem com isso – sempre disse que viver sozinho não é o fim do mundo, e no mínimo você pode assistir os jogos das 16h e das 18h no domingo. Enfim, se você está sozinho, tem que saber aproveitar.
Não, viver sozinho não é ruim.
Mas para mim, estar com Marcele é melhor.
Melhor do que sozinho ou acompanhado com qualquer outra neste mundo, enfim, com ela é melhor do que qualquer outro jeito.
Obrigado, moça. Você veio chover e veio brilhar em minha vida.

10 caixas de engraxate
Costumo dizer nos papos de botequim que o Plano Real fez mal à música. Explico: as gravadoras, seja de que país for, nunca trouxeram benefícios ao pop com suas exigências periódicas aos artistas – esse papo de um disco por ano ou dois a cada três só servem para, por exemplo, fazer Neil Young flertar com o tecno só de sacanagem, como aconteceu na década de 90.

Agora, pegue-se um cenário de repentina prosperidade, de aumento no consumo, misture-se isso com uma fácil propagação de ritmos e letras fáceis e digeríveis, e taí o cenário para as gravadoras venderem mais aqueles discos prateados que chamamos de CD. E creia-me, do mesmo jeito que a maioria dos patrões detesta ter que pagar salário, pode acreditar que a maioria dos executivos de gravadora certamente odeia ter que colocar som naquele disquinho – e adorariam que todos nós comprássemos dezenas deles para forrar as paredes de nosso quarto.

Assim, com o plano Real, pintou uma cacetada de conjuntos musicais com fórmula igual: um tecladinho (acima de tudo), uns caras de terno branco, letras que falam de sexo sem usar palavrões e muitos sorrisos. E vários nomes tipo raça, pirraça, raça negra, etc.

Claro que o hábito de fabricar artistas não começou com o plano de desemprego do Fernando Henrique, óbvio. Afinal, lá nos EUA o Vanilla Ice nem sabe o que é Pedro Malan. Mas deve-se observar que a coisa aumentou com o Plano Real, e se espalhou para o dito Pop/Rock.

Com a retração da economia, porém, o espaço ficou pequeno e um dia ia acontecer mesmo o que rolou no Aeroporto Santos Dumont. É pouca audiência para muito Art Popular e LS Jack. E como pessoas “de bem”, tomaram a decisão mais racional: vamos decidir na porrada.

10 caixas de engraxate (cont.)
Fica combinado assim: ninguém pode falar mal do LS Jack nesse país, senão entra na porrada. É o que deu para concluir lendo a matéria no Globo desta segunda-feira, 28 de julho. O que mais me espantou, porém, foi o sujeito que canta na banda querer subornar um engraxate para que este não testemunhasse. Prometeu dez caixas de engraxar sapato, como se resolvesse alguma coisa.
Esse é o cara que fica à frente de uma banda, com “pose rocker”, encantando menininhas. Um sujeito que ameaça engraxates.
Do lado do Art Popular, veio um que se desculpou: “O Leandro só falou mal do disco do Ed Motta e eles pensaram que era com eles”.
Espero que agora o Ed Motta tome uma atitude e vá cobrir o Leandro de porrada por isso, ora.
Enfim, o episódio serviu para todos nós darmos risada e também para mostrar a cara verdadeira dos “artistas” – em O Globo saiu que o LS ganhou o “Prêmio Austregésilo de Athayde” como a melhor banda de rock 2002. Um prêmio tão inusitado quanto, por exemplo, “Prêmio Fernando Baiano” para a obra de engenharia mais perfeita, sei lá. Aí a matéria explica que o guitarrista é filho de um dos membros da ABL.
Está explicado porque o vocalista ameaçou o engraxate. São daquele velho Brasil de sempre, o do “sabe com quem está falando”, só que com o verniz dos novos tempos de “prosperidade” e “qualidade total”.

10 caixas de engraxate (cont.)
Aproveito para sugerir novas porradas: que tal B5 x KLB? Ou B5 x Detentos do Rap? Por que não aproveitar que ele está debilitado e colocar o Herbert Viana para ser justiçado pelo eterno inimigo Lobão, o cara que mais posa de irreverente e inteligente no país mas que desejou a morte da mãe? Podia rolar também um Nescau no Humberto Gessinger – todos contra ele.
Fica então desde já o pedido: alô, MTV, por favor, convidem as duas bandas para o Rock Gol 2004. Não vou perder um sequer – ainda mais se sortearem ambos para o mesmo time.

Este post é um oferecimento de Bextra, Paracetamol e Katadolon, em associação com Fisioterapia A. Santiago e Cataflan

27 julho, 2003

Esse também é ídolo



Mesmo quando eu fingia não gostar do rei Roberto Carlos (nos tempos de roqueirismo radical aos 16 anos) eu respeitava o Tremendão Erasmo com a reverência devida. Até mesmo seu lamentável defeito, que é torcer por aquele time de São Cristóvão, assume contornos dignos, numa conversa rápida com ele. "Meu maior troféu, que mantenho até hoje. é uma camisa do Vasco, me dada pelo Alcir, manchada de sangue", me disse o Tremendão uma vez, em entrevista.
Seus sucessos sempre foram na contramão do adolescente Jovem Guarda. Se os meninos da Jovem Guarda era rebeldes mas filhos dos tijucanos do PL, o Tremendão vinha com uma música ("Close") em homenagem a um travesti. Se a onda dos imitadores de James Dean era andar em grupos onde só havia homem, ele fazia uma ode à vida de casal, "Mulher", em homenagem à Narinha. "Sou forte mas não chego a seus pés", cantava o Tremendão à sua musa Narinha, morta em 1996.
E sempre me emocionou o momento de todo final de ano, quando no especial de sempre da Globo, aquela voz anasalada anunciava "O meu amigo...Eraaasmo Caarlos!", e aí ele entrava ao som de "Você, meu amigo de fé, meu irmão camarada...".
"Festa de Arromba", "Fama de mau", "Mesmo que seja eu", "Pega na mentira" (ótima, essa, sonhando com Zico no Vasco ao lado de Pelé) são músicas que fazem parte da construção de um rock nacional, verdadeiro - pena que os críticos especializados e entendidos só considerem rock nacional aquele com influência britânica dos anos 80. O Tremendão, para mim, é a base de tudo.
Agora, ele me solta a frase que me motivou a escrever esse post. Em especial (ótimo) no Multishow, anunciando que volta a fazer excursões pelo país, ele manda muitíssimo bem:
- Estou caindo na estrada. Mas quero cair na estrada mesmo, aquele negócio de almoçar em churrascaria de beira da estrada, sentar na mesa, conhecer o dono, a mulher dele, os filhos, tocar um violão, conversar, conhecer pessoas, enfim, estrada de verdade, não esse negócio de esperar dez minutos e pegar conexão em aeroporto limpinho e moderninho não.
Sensacional, o Tremendão.

Cuba
Se até Saramago discorda do que acontece em Cuba, quem sou eu para contestar ou defender a ditadura do Fidel. Não disponho de bagagem para isso e sequer já estive na ilha, apenas leio que por lá não há riqueza mas também não há gente morrendo em filas de hospitais ou velho vendendo lápis em porta de botequim. Note: apenas leio sobre isso, nunca fui para ver se é verdade.
Mas tenho implicância com a maneira apressada com que todo mundo da imprensa brasileira anuncia um peidinho que seja de Fidel Castro. Todos festejam o fato de alguns cubanos terem improvisado um barco de um caminhão GM, ano 1957, mas ninguém me traz um perfil psicológico dos sujeitos que tentaram fugir para Miami. Para começar, e se os caras estão fugindo de Cuba por mera boiolice?
Ninguém implica com a babaquice que é alguém querer fugir para Miami sem estar envolvido em concordatas fraudulentas, por exemplo (ou em desvio de verbas em empresas brasileiras, fudendo a vida de milhares de trabalhadores). Esses caras sim é que têm necessidade de buscar uma cidade como Miami.
Me lembro de 1989, quando houve a grande festa do "fim do socialismo", li nos jornais a frase de um "pobre alemãozinho" finalmente liberto (um sujeito que provavelmente é milionário se comparado a um classe média baixa brasieiro):
"Pensei que ia morrer sem conhecer Paris".
Uma frase dessas, se dita numa roda de chope lá na Cobal do Humaitá, seria alvo de milhões de sacanagens. Mas para a imprensa brasileira que analisa o socialismo, é uma verdadeira desgraça, um alemão baitola ter tolhida sua liberdade de ir a Paris ficar dançando e cantando 'Sassaricando'.
Ficamos combinados assim: me enternecerei sempre com os caras que fogem de Cuba, tudo bem, usando recursos extremos. Mas antes, tranquem os malandros em uma sala, sozinhos, com um pedaço de veludo. Se alisarem o veludo antes de 15 minutos, é porque fugiram de Cuba por frescura.

25 julho, 2003

É por aí
Duas horas de cama e TV podem fazer seu mundo ficar muito melhor. Mas dez horas seguidas com certeza o tornam muito pior
Kevin Arnold, em "Wonder Years" (Anos Incríveis)

24 julho, 2003

Resumo da dor
"O disco L5-S1 apresenta redução da altura e intensidade de sinal em T2 por degeneração, e apresenta protusão discal póstero-mediana e para-mediana à direita, que comprime a face ventral do saco dural e toca a raiz de S1 emergente"

Esse é o laudo da ressonância magnética que fiz no LABS sábado passado. Em bom português: tenho uma (ou várias) hérnia de disco.
Em tempo: não, "saco dural" não é nada disso que vocês estão pensando.

23 julho, 2003

Alguns pensamentos da Convalescência
1- O Canal Sony é feito especialmente para pessoas acamadas.
2- O horário de 17h às 19h30 é um perigo para a próxima geração. Explico: é o horário em que as crianças vêem televisão antes dos pais chegarem do trabalho, e milhões delas podem estar assistindo a programas simplesmente repugnantes como o de Milton Neves e o de Datena - este último rasgou toda a ética jornalística, ao mostrar (e dar o nome) uma senhora de 80 anos estuprada pelo genro. Qualquer estagiário que tenha um mês trabalhando em Geral sabe que nomes e rostos de mulheres estupradas não devem ser mostrados. Usava-se dar iniciais, mas hoje em dia se escreve "X., de 19 anos". Datena, portanto, deveria ter o registro cassado, se a profissão de jornalista tivesse um órgão regulador da eficiência, digamos, de um Cremerj.
3- Ficar sentado é ruim.
4- The Nanny é chato. Good Morning Miami é bom porque é ruim. Married with children é sensacional. Friends é legal. Mad about you é bom para quem namora. Ally McBeal é bom para quem não namora. John Doe é bom. Arquivo X já enjoou. E aqui no Rio os programas esportivos (tirando o Globo Esporte) são um lixo.
5- Tenho saudades de outro sabor que não seja o de sopa de legumes (por causa da suspeita de hérnia, tive que fazer pesada dieta).
6- "Bem Amigos" poderia ser apresentado pelo Jorge Perlingeiro - teria menos rasgação de seda. Enfim, é um programa de comadres.
7- Fizeram dezenas de matérias sobre a preservação de Ipanema e ninguém ouviu o Ruy Castro, autor do melhor dicionário sobre o bairro (Ela é Carioca).
8- Meu atual drinque preferido: Cataflan com gelo.
9- A intelectualidade detesta o hotel a um real, o almoço a um real, o cabeleireiro a um real e o café da manhã a 35 centavos (esse último, servido na estação Saracuruna, bairro pobre da Baixada). Bom, eu acho que seria melhor se não houvesse a necessidade de nenhum deles. Mas não acho que seria melhor que não existissem.
10- Não poder fazer porra nenhuma é simplesmente uma merda absoluta.

20 julho, 2003

Magnetismo Ressonante




- É, não tem jeito, vou ter que pedir uma ressonância magnética.
O meu ortopedista pediu isso enquanto eu relinchava de dor na frente dele. Não entendi porque ele fez uma cara de “foi mal aê”. De tanto ouvir falar desse exame, o qual é feito por jogadores de futebol ad nauseaum, achava que era algo tão corriqueiro quanto uma marteladinha no joelho. No máximo um aparelho emitindo ondas magnéticas.
Logo que entrei na sala dos exames, neguinho me mandou colocar uma roupa verde daquelas de pacientes internados em séries americanas. Peraí. Já estranhei.
Sou levado a outra sala e, sim, dou de cara com um daqueles tubos que a gente só vê em propaganda de plano de saúde – isso, aqueles mesmos que você vê com alguém deitado dentro, tendo somente uns 10 centímetros de ar acima do nariz.
A minha pergunta foi óbvia e transpirava pânico:
- Minha cabeça vai ficar para lá (pra dentro)?
A médica disse que o local era ventilado (e é realmente muito ventilado), que não havia problemas, etc. Me deram um par de tapa-ouvidos, estranhei na hora. “É por causa do barulho”. Coloquei e fiquei meio surdo. Colocaram na minha mão direita uma esfera de borracha ligada a um tubo, uma esfera apertável. Pensei, “Sei lá, deve ser pro cara apertar essa porra pra se distrair”. Sério mesmo que não consegui pensar em algo coerente para fazer com aquela bola de borracha dentro daquele sarcófago.
A maca em que me deitei foi deslizando lá para dentro e logo meu mundo ficou meio bege. Em seguida, começou a sessão – uma série de campainhas e zumbidos que me fizeram entender de uma vez por todas como surgiu a música tecno (juro que já ouvi coisas simplesmente iguais no terraço da Loud!, onde só toca esse lixo).
Aí, sei lá porque cargas d’água, apertei a merda da bolinha. Pararam tudo, me puxaram, ligaram o alto-falante e perguntaram se tava tudo bem. Eu tava meio grogue e respondi que sim, ué.
- Um pouco de claustrofobia? – perguntou uma médica.
Eu respondi o óbvio – sim, afinal, não há ser humano que entre num lugar daqueles sem lembrar do poema “Enterrado vivo”, do Vinícius de Morais.
Depois que percebi que a bolinha de borracha era na verdade a campainha de emergência, e que eu só deveria apertar em caso de passar mal. Mas, enfim, ainda tive que ouvir, após uma leve advertência, que “o exame dura de 20 a 30 minutos”. Puta que pariu.
Só sei que o resultado sai quinta-feira. E que posso ter uma hérnia. Bom, nada mal, para quem não tinha nada (no banco).

19 julho, 2003

O Dia da Pizza
Para fins comerciais, acho que só deveria haver Dia dos Pais, Mães, Namorados e Criança. Nem avó. Avó é mãe, ora essa. Além deles, Natal, Páscoa, Carnaval, Corpus Christi e chega – os feriados católicos. Nada é mais estranho a meu ver do que os “dias de”, como Dia Internacional da Mulher (um dia “dedicado” a metade – ou mais – da população mundial), Dia do Jornalista (tão brincando?), Dia do Marinheiro e outras frescuras mais. Tem até Dia do Diagramador (que também é jornalista, ora). Enfim, tudo balela.
Em julho, neguinho escancara: dia 13 é Dia do Rock, dia 15 é Dia do Homem e dia 19, neste sábado, é Dia do Futebol. Inacreditável e ridículo.
Para mim, Dia só deve existir com pelo menos um dos dois seguintes fatores de motivação: 1- Ser feriado para o homenageado
2- Levar à comemoração típica do dia (existe o Dia do Vinho? Esse é legal).
Por isso, curti o dia 10 ser o Dia Mundial da Pizza. Taí. Tudo a ver. É o dia em que o bombardeio publicitário leva o cidadão a praticar um dos atos mais lícitos, honrados, deliciosos e calóricos do mundo: comer uma boa pizza.
Até hoje quando vejo novidades tecnológicas inúteis – tal como fazer fotos com celular para transmitir a outro celular da mesma companhia – eu me revolto um pouco. Afinal, onde estão cientistas japoneses, alemães, coreanos, americanos, que se dedicam a babaquices como corrida armamentista ou enviar homens a Marte, em vez de encontrarem logo a fórmula que permita ao ser humano devorar pizzas eternamente sem ficar do tamanho do Michael Moore?
Para mim, a modernidade não existe enquanto não me disserem como eu posso ir a São Paulo, comer pizzas no café, no almoço e na janta e voltar com o mesmo peso. Aliás, sempre que vou a São Paulo volto com mais quatro ou cinco quilos.
Ninguém me convence com esse papo de tempos modernos enquanto eu tiver que passar semanas na base de execrável sopa de legumes (meus problemas ortopédicos têm me obrigado a perder peso, além de todas as dores). Porra, que catzo, mas será que não há nenhum código a ser quebrado, nenhuma fórmula de engenharia genética que permita que eu me alimente apenas de pizzas (com Centrum para completar o resto das vitaminas...)???
Garanto que se isso acontecesse eu e minha namorada seríamos muito mais felizes neste mundo. As pizzas estão para Marcele como a lasanha está para o gato Garfield.

O Dia da Pizza – 2
Para comemorar o Dia Mundial da Pizza, fomos ao Tiramisu do Botafogo Escada Shopping, que tem uma pizza bem razoável. Dando seqüência às comemorações, segue minha lista de pizzas cariocas (a primeira deixa muitas de SP no chinelo):




1 – (primeiro lugar absoluto) Pizza do restaurante Zio Pepperoni (Rua Muniz Barreto, atrás do Botafogo Praia Shopping). Pizza DOC (Denominação de Origem Controlada). R$ 16 a R$ 20
2- Capricciosa (só porque falam, eu nunca comi). Acima de R$ 20
3- Pizza da Sinuca Bola de Cristal, Largo do Machado (levam quase uma hora para fazer, mas é do cacete, parece pizza feita pela mãe da gente – algo inusitado para uma sinuca). R$ 12.
4- Tiramisu, do Botafogo Praia Shopping, excelente pizza. De R$ 18 a R$ 27
5- Bar Botequim, em Botafogo. Lá não é pizzaria, mas tem uma pizza para lá de honesta. Até R$ 15
6- Círculo Militar da Praia Vermelha. Não fosse a música ao vivo (que é até boa, mas, sei lá), e seria pau a pau com a Capricciosa. Alguns lugares são até perto demais do forno, convém evitar por causa do calor. O lugar é lindo, à beira-mar, com uma puta visão da Praia Vermelha, do mar noturno, do Pão de Açúcar, ao ar livre. Programaço. Só tem um porém: na entrada, uma mulher de walkie-talkie pede para você aguardar lugar (sem problemas esperar ali) e de repente os milicos que são sócios e pagam mensalidade vão passando na sua frente. De R$ 15 a R$ 20.
7- Armazém do Chopp, na Rua Marquês de Abrantes, no Flamengo – é em frente à Bennett, e entram na categoria Pificaca (Pizzas fininhas caras pra caralho), como a do Tiramisu e a do Pizza Park, na Cobal do Humaitá. Mas a provençal é das melhores que tem. O chopp é bom, apenas isso. Há muito tempo deixei de acreditar em chope de lugares que tem “do chope” no nome (Sindicato do, Armazém do, Escritório do, Planeta do, etc). Acima de R$ 20.
8- Pizzaria Guanabara, no Leblon. Tradicionalíssima, e criticada severamente por muita gente boa e que entende do assunto, como o jornalista João Carlos Pedroso. Eu continuo defendendo, principalmente a de tomate seco, a melhor da casa. Acho que gosto tanto da pizza de lá porque é o Cervantes das pizzas: você chega ali no balcão quatro da manhã, bebum, e pede uma fatia, e vai para casa satisfeito. Em tempo: acho que só comi sóbrio uma vez. Estava meio sem orégano. Acima de R$ 15.
9- Bar Jóia . Esse botequim meio encravado no Jardim Botânico tem daquelas pizzas sensacionais de vitrine de balcão (um verdadeiro atentado aos puristas). E é um espetáculo. E o chope é excelente. Há anos não vou ao Jóia. A pizza inteira lá, grande, deve estar uns R$ 8.
10- Tratoria. A pizza é excelente na Tratoria, restaurante italiano que não trabalha com cartão de crédito, e que fica ali na Rua Fernando Mendes (seria justa homenagem, mas não deve ser o cantor), primeira transversal à Atlântica, sentido Ipanema, de quem parte do Copacabana Palace. Mole de achar. A pizza de manjericão vem com folhas enormes, das quais você poderia improvisar uma canoa em caso de enchentes. O problema lá é que sempre que vou acabo pedindo o mesmo que minha namorada: espaguete à Matricciana com vinho Aconcágua, arrematando com a torta alemã de lá, que é capaz de ressuscitar toda a Luftwaffe. Outro programaço, que eu fazia nos tempos em que não precisava tomar sopinha de legumes para perder a porra da barriga e sofrer menos com as dores lombares e de quadris. Enfim, pizza lá entre R$ 13 e R$ 19.
Espero conseguir fazer uma lista com as 10 melhores Pizzas Delivery (e, com serviço completo, dando o telefone). Sugestões?

18 julho, 2003

Dor = mau humor
Mas não é porque estou com dores absurdas e escrevendo em pé aqui no trabalho que eu vou deixar de avisar: quem colocar link para blog de colunista do Globo vai ser chamado de puxa-saco. Valeu? No nosso Brasil novo, só se dá link para pobre.

17 julho, 2003

Oferta de emprego (sic)


Acima, retrato dos primeiros estagiários da história do Brasil

Do site Comunique-se:

Cargo Estagiário
Setor de clipping impresso e eletrônico
Descrição A assessoria de imprensa XXXXX Comunicação contrata estagiário para trabalhar no setor de clipping impresso e eletrônico da empresa. Os interessados devem estar cursando jornalismo, do 1º ao 4º período, com experiência nos programas Dreamweaver, Photoshop e PageMaker. Horário de trabalho: 8h às 17h. A remuneração oferecida é de R$400,00 + vale transporte. Os currículos devem ser enviados para escravos@escravos.com.br
No. de Vagas 1


O pior é que chovem candidatos. Mesmo com salário de 400 paus pelo período de 8h às 17h - nem sei se está dentro da lei um estágio assim.
Outro dia tinha um anúncio só que para profissional contratado. Pedia conhecimentos de Word, Excel, Windows, Frontpage, Dreamweaver, Flash, Photoshop, noções de rádio, boa apuração, texto final, experiência, disponibilidade aos fins de semana e se vacilar até pedia que o candidato levasse o álbum de figurinhas da Copa de 1982 do chiclete ping pong completo.
Salário: R$ 800.
Me deu vontade de ligar para lá e perguntar se eles costumavam ir na rodoviária e pedir para entrar no ônibus que vai a Porto Alegre com um bilhete de Arraial do Cabo. Para mim, é quase a mesma coisa.
O que importa é que devo começar em breve a escrever meu livro Jornalismo: por que você não deve cursar e como dizer a seu filho que é roubada. Espero que seja um sucesso, para o bem de milhares de jovens.

Enfim, notícia boa
Não, não é isso que é a notícia boa. Não estou nem aí para as promessas de “união” de Rosinha e de César Maia pelo Pan de 2007 (quando ambos, espero, já estarão fora de seus cargos atuais) e pelos Jogos de 2012. É realmente incrível. Prefeitura e governo esboçaram uma união na área da Segurança Pública (mas não fecharam nada), mal se entendem na questão do desemprego e ainda borram na hora de definir alíquotas de impostos – tanto é que o Estado aumentou o ICMS assim, sem nenhum entendimento com as prefeituras no sentido de verificar se a carga tributária não iria afastar as empresas do Rio.
O ICMS deve ter ficado maior em janeiro porque aqui é um estado muito seguro, em que os empresários nunca são seqüestrados, por isso o Rio já é atraente por si só.
E aí seguimos assim, orgulhosos das nossas Olimpíadas e fazendo parcerias para 2007, enquanto o desemprego e a miséria tomam conta do Estado do Rio.
Mas no meio dessa lambança toda, consegui acordar e dar de cara com uma notícia, se não boa, pelo menos alentadora: o investimento de R$ 2 milhões na reforma do cine Roxy, ali em Copacabana, lugar onde assisti Guerra nas estrelas, lá pelos idos de 1978.
Comentei lá embaixo sobre o horror das “novidades” e citei en-passant os Cinemarks. É claro que volta e meia vou parar num desses complexos de cinema, até porque os bons cinemas de rua andam rareando. E é claro que na primeira vez em que pisei em um Cinemark achei ducacete: oito cinemas no mesmo lugar, lanchonete, fila única para ingressos.
Até que olhei de perto.
Nos cinemas: em quatro passava Senhor dos Anéis (gosto do Duas Torres), em dois passava Harry Potter, em um passava Harry Potter dublado e no restante o último desenho da produtora de Procurando Nemo.
Nas lanchonetes, um saco de pipoca, talvez o snack mais barato do mundo (os agricultores que morrem na merda e imersos em calos vendem milho por 20 centavos a tonelada), custa seis reais. A Coca merdalight (não conheço outra versão de coca-cola que não seja a Light) sai por dois reais.
Na fila única, vidraças à prova de balas, alto-falantes e sempre com uma mulher lá dentro que deseja “bom filme” a alguém mais ou menos 700 vezes por dia. Caralho, isso é monstruoso.
A grande merda é que tecnicamente são cinemas perfeitos, em som, imagem, poltrona. Mas a impressão é de que são cinemas para quem não gosta de cinema, e sim de montanha russa.
Fui com Marcele ver um dos piores filmes de todos os tempos outro dia: Hulk. Lá pelos 40 minutos de filme, depois de me irritar com um diálogo em que Nick Nolte elogiava os olhos de uma mulher, nos levantamos do chão onde estávamos sentados (filas quilométricas dentro do shopping) e fomos embora. Não queríamos perder a noite, por isso andamos um pouco até o Espaço Unibanco e conseguimos um ingresso para “O homem que copiava”.
Me senti tão mais em um cinema que fiz questão de comprar a pipoca fria do Unibanco. Sentamos no lugar que queríamos e vimos um filmaço, com diálogos bem construídos, com pontos de virada (e não um filme cujo maior ponto de virada seja a transformação de um cara em uma coisa verde), conflitos, tramas, e atuações espetaculares dos atores, até da Luana Piovani, que nunca me encheu os olhos como atriz.
A impressão de tudo, no final, é que a tal padronização torra o saco. O pior de tudo é que as pessoas fazem questão de fingir que acham melhor.
Um dia quero ver se alguém vai achar a esfiha do Habib’s (é padronizada, igual em todas as filiais) melhor do que aquela da galeria no Largo do Machado. E pago para ver um fast-food limpinho ser melhor do que o sanduíche de carne assada do Belmont, feito por um galego que acabou de coçar o nariz.
Por isso tudo, longa vida ao Roxy. Longa vida ao velho e bom cinema de rua. Agora que estou sem celular, vou aderir ao movimento fundado por Luis Edmundo Araújo: vivam as velharias, abaixo a modernidade.

16 julho, 2003

60 anos esta noite



No próximo dia 26, Michael Phillip Jagger completa 60 anos. A idade do vocalista da maior banda de rock and roll de todos os tempos me assusta um pouco, achava que ver Mick Jagger completar 60 anos fazia parte de um dia que jamais chegaria – ainda mais para mim, que quando criança li Jagger dizendo, insolente como sempre, “não quero chegar aos 40 anos cantando Satisfaction. O cara já excedeu o limite dele em 20 anos. Graças a Deus. Bom, não sei se Ele tem tanto a ver com isso assim. Não quero ser excomungado pela Igreja Católica ao escrever que Deus tem a ver com corpos boiando em piscinas, drogas, prisões, tumultos, facadas e traições.
Jagger e Richards volta e meia ficam sem se falar – mas até hoje eu acho que é balela, puro “gênero” que os dois fazem. Afinal, quando os dois eram três (nos tempos em que o sensível e ingênuo Brian Jones tocava guitarra), deu para ver quem mandava. No caso, Brian Jones só obedecia. E obedeceu tanto que acabou boiando em uma piscina.
Antes disso, os caras deitaram e rolaram, colocando crédito próprio em obras-primas de Jones como Paint it black (Jones toca cítara nessa) e Mother’s little helper. Brian ficava deprimido, mas Jagger e Richards (que faz 60 em dezembro) cagavam e andavam.
O otário seguinte foi Mick Taylor - excepcional guitarrista - que deixou a banda ao ver Jagger & Richards escrito nos créditos de sua maravilhosa Time waits for no one (seguramente uma das 100 músicas mais lindas que a humanidade já produziu).
Eu via tudo isso com temor mas ao mesmo tempo com fascinação – não pelas sacanagens, mas pelo fato de os Rolling Stones estarem acima até deles próprios.
E hoje confirmo. Vem moda, vai moda, vem hype, vai hype, falam em tecno, trance, drum and bass, falam em “DJs fazendo música” (nada mais lamentável), falam em new-bossa, mas nada disso movimenta tanto a humanidade quanto o lançamento de mais um disco dos Rolling Stones – queiram ou não os colunistas musicais adestrados. Na última vez, para lançarem Four Sticks, sua coletânea, tocaram no terraço de prédios (como os Beatles) e engarrafaram Nova York.
Quanto a mim, sou grato aos Stones e a Jagger por Wild Horses, Moonlight Mile, As tears goes by, Lady Jane, She smiled sweetly, Midnight Rambler, Gimmie Shelter, Let it bleed e mais umas quatrocentas músicas e uns 25 LPs. Uma obra inigualável, vasta, que atravessa quatro décadas e praticamente toda a minha vida – uma vida cuja relação com a música começou com um velho compacto 45 rotações com Penny lane de um lado e Strawberry Fields Forever do outro.
Uma simples brincadeira ao abrir uma conta de Hotmail (em 1997, quando eu estava no JB e mal sabia quem afinal tinha email para eu poder me comunicar), ao ver que já havia todas as variações com o nome “Gustavo”, deu origem ao nick “gustones”, em homenagem aos caras. Nunca mais deixei de lado. Como deixar de lado qualquer coisa relacionada aos Stones?
Afinal, eles estavam lá com You can’t always get what you want, nos momentos de perda e dor, tocavam ao fundo Wild horses nos fins de porre na madrugada, estavam com I got the blues quando fui de ônibus à Bahia via céu estrelado da estrada, presenciaram alguns (poucos, é verdade) beijos em bocas com Memory motel, Fool to cry, Angie e me confortaram nos momentos após enterros com Till the next goodbye (outra obra-prima).
Estavam lá na minha frente tocando “Like a rolling stone” na Apoteose em 1998 com Bob Dylan, quando minha amiga tijucana Cris se esvaiu em lágrimas – não à toa.
E, claro, estavam em Penedo com “Sweet Virginia” quando curtia com meu amor à beira da piscina.
E sempre estava lá a voz de Michael Phillip Jagger, o esganiçado mais afinado do mundo, esse sexagenário que permitirá um milhão de trocadilhos com seu novo adjetivo.
No dia 26, então, terei dois motivos para comemorar (espero começar a usar alianças nessa data). E três dias depois, é nosso aniversário de namoro.
Brindarei com vinho a nós e a Mr. Jagger. Que espero, prometa que vai chegar aos 80 cantando Jumpin Jack Flash.

Da série ISSO TAMBÉM ME ENCHE O SACO

Achei o post abaixo no blog de um casal que chegou aqui ao Tem, mas acabou de alguma forma que eu não sei qual é. Só sei que assino embaixo e relaciono fácil na minha lista de 10 hábitos urbanos irritantes.

Eu tenho verdadeira antipatia por pessoas que, no telefone, pedem identificação da pessoa do outro lado da linha dessa forma:
- Alô?
- Alô, a Fernanda está?
- Quem quer falar com ela?
- O Júlio.
- Ah, Júlio, sou eu mesmo, tudo bem?
Cara, pra que fazer isso? Eu só consigo imaginar 2 situações:
Ou você é devedor e está fugindo dos credores feito diabo da cruz.
Ou você tem muitos conhecidos chatos e pretende fazer uma triagem dos mais pentelhos antes de atender.
Ninguém merece essa síndrome de secretariado executivo!
Por Camila


Benedita é isso aí
Saiu nesta quarta-feira em O GLOBO: Benedita da Silva atendeu ao pedido de uma diplomata americana, que pediu nada menos que o cancelamento da exibição de Tiros em Columbine em áreas carentes. Segundo a nota, o filme - que é de um americano - contém "propaganda antiamericanista demais". Por isso, a diplomata pediu e foi atendida.
Acho que o filme é antiamericano de menos e a Bené pro-americana demais. Só isso explica atender um pedido desses - o filme passaria em comunidades como forma de propaganda anti-armas - oito meses depois de, como governadora, ter concedido anistia de R$ 100 milhões à Coca-Cola (eternamente um símbolo americano).
Esta é a real.

A Copa de 50 e os irmãos Karamazov dos estados brasileiros



Hoje é dia 16 de julho, dia em que, há 53 anos, todo mundo chorou ? o Brasil perdeu a Copa no Maracanã para o Uruguai, naquela que talvez seja a maior vitória de uma seleção em final de Copa do Mundo na história. Os uruguaios superaram 200 mil pessoas e um país inteiro em clima de ?já ganhou?.
O que pouca gente costuma lembrar é que enquanto nós aqui no Rio perdíamos a Copa para o Uruguai, lá no Pacaembu ? na verdade, duas horas antes - a Suécia vencia a Espanha (3 a 1) em uma insossa decisão de terceiro lugar. Ainda está registrado na história que aproximadamente 8 mil pagantes estavam no Pacaembu ? algo impensável no dia de hoje, na era da TV. Certamente, com uma final no Maracanã, ninguém em parte alguma do Brasil estaria dentro de outro estádio duas horas antes do jogo que não fosse o Maior do Mundo.
Eu vejo essa perda de Copa no Maracanã e essa decisão de terceiro lugar desinteressante como ?another brick on the wall?, mais um tijolo na parede do gigantesco rancor que São Paulo alimenta contra o Rio de Janeiro, rancor este que é visível nestes tempos em que o Rio vence a disputa interna pelas Olimpíadas de 2012 (eu, como já disse, preferia uma Copa).
No dia em que anunciaram o resultado, mais ou menos um minuto depois, eu já recebia email de um dos meus chefes (de São Paulo) dizendo que o Rio não vai ganhar o direito de sediar 2012, como se isso fosse uma espécie de consolo.
Ora, qualquer cidadão em sã consciência sabe que as chances das duas cidades são muito reduzidas, devido a seus abismos sociais absurdos.
Se São Paulo tivesse perdido para Belo Horizonte, tudo bem. Mas perderam para o Rio. E isso parece incomodar demais.
Nenhum dos meus diversos amigos paulistas notou o ?discurso da competência? usado pela prefeita Marta Suplicy, na minha opinião um discurso extremamente grosseiro, usado pelo sr. Paulo Maluf em 1989 para combater a candidatura, adivinhem de quem? De Lula, presidente da República e do mesmo partido de Marta. ?Presidente competente?, dizia o pavoroso Maluf.
A prefeita disparou um ?isso aqui não é concurso de beleza, e sim de competência?, como se os cariocas fossem Kelly Keys rebolantes, como se aqui não houvesse obras suntuosas, espetaculares, como as linhas Amarela e Vermelha, como a Passarela do Samba, como o Rio Cidade e a extensão da Linha 2 do Metrô. Resultado: foi devida e merecidamente esculhambada, sim, com um ?beleza é fundamental?.
Grosseria de César Maia, claro, mas estava engasgado. Cansa muito esse ressentimento de São Paulo, esse sentimento que vem desde a década de 20 (lembremos a seleção da Copa de 30, onde já teve briga), e que atravessou um século, baseado na teoria de que os cariocas não trabalham e são desorganizados. Reforçam a tese dizendo que São Paulo é metrópole e o Rio é província - se isso fosse verdade, não seria vantagem nenhuma. Ser megalópole não garante qualidade de vida a nenhum habitante. Tanto é verdade que nos medidos de qualidade de vida tanto Rio quanto São Paulo costumam ficar atrás de Niterói.
Essa tese oculta, na verdade, que as duas cidades têm milhões de pessoas que trabalham muito e ganham mal, que as duas cidades têm problemas graves de violência, que as duas cidades empurram cada vez mais gente para o tráfico, que a periferia de ambas às vezes até se une para protestar, nem sempre de forma pacífica.
São Paulo jamais nos perdoará por termos deixado para eles a decisão do terceiro lugar. E por termos, como naquele 16 de julho, tirado eles da parada só para perdermos nós mesmos.
Por isso, parafraseio Nelson Rodrigues, quando se referiu ao Fla-Flu: Rio e São Paulo são os irmãos Karamazov da federação dos estados brasileiros, vivem há quase cem anos no ressentimento e no rancor.
Eu, por mim, queria mais era poder andar no calçadão de Ipanema e terminar bebendo uma cerveja no Opção, ali atrás do Masp, pertinho da Paulista.

14 julho, 2003

Atira e acerta
Michael Moore é ídolo desde que fazia o TV Nation ao lado de gente como Louis Theroux e Steven Wright. O programa obviamente foi cancelado pela NBC e nós aqui no Brasil nos fudemos por tabela.



Só que, além do espetacular "Tiros em Columbine", o iniciante em Michael Moore já pode atacar "Stupid white men", o livro dele que chegou a ser censurado por detonar demais a era Bush.
Olha, o cara pega na veia e manda no ângulo. Transcrevo aqui, com todo o prazer:
(...) Não existe recessão, meus amigos. Não há queda. Não há tempos difíceis. Os ricos chafurdam no espólio que acumularam nas últimas duas décadas e agora querem ter certeza de que não sairemos procurando nossa fatia do bolo.
Os ricos fazem tudo o que podem para nos convencer a não pedir nossa parte, porque segundo eles, NÃO HÁ O SUFICIENTE! Noite após noite, os meios de comunicação dos quais os ricos são proprietários contam uma história triste atrás da outra, sobre a última empresa de internet que fechou as portas, ou do fundo de investimento que perdeu tudo ou do investidor da Nasdaq que afundou. (...)
Ah, é tudo verdade. Eles não mentiriam para nós.


Ironia, na medida certa, é uma arte. Em breve aqui, mais trechos de "Stupid White Men".

Um minuto de barulho por...

COMPAY SEGUNDO



Quando vi "Buena Vista Social Clube", já entrei no cinema querendo ver a tal cena em que Omara Portuondo cantava "Veinte años" aos prantos ao lado de Ibrahim Ferrer. É um momento único, belíssimo, até por causa da letra da música, que fala de amores que mudam, de saudades dolorosas, e de pedaços de alma que se arrancam sem piedade. No mesmo filme ainda tem a paulada que nos dá na alma o pianista, Ruben González, sumindo em um horizonte sem infinito, batendo na perna um saco plástico velho com fotografias de uma vida que parece ter sido vivida por outra pessoa.
Ibrahim Ferrer é outro desses personagens, a maioria fudido com o fechamento dos cassinos e boates que se seguiu com o regime de Fidel. Nenhum deles, porém, chora miséria com isso - o que só dá mais grandeza a cada um dos personagens.
Na manhã desta segunda, recebi a notícia da morte de Compay Segundo aos 95 anos com a surpresa de quem perde um velho conhecido. Mandei até email para a Teresa, que me mandou mensagem aqui para casa falando da morte de Compay, dizendo que foi "uma morte prematura".
Claro que foi prematura. Compay, no filme, promete ter mais um filho, mesmo dizendo que fuma desde os quatro anos de idade, devido ao fato de sua avó pedir a ele que acendesse os excelentes charutos Havana (é aquele negócio, ser pobre e fumar charutos Havana, ser pobre e beber uísque nacional em Glasgow, quem se importa?) para a velha dar suas baforadas e fazer lá seu vudu.
Compay Segundo cantando era um espetáculo de raça e de uma virilidade desaparecida. Algo como nossos avôs nos mostrando roupas ou adornos de homem - Compay cantava com a macheza de um avô nos dando a abotoadura que usaremos no dia de nosso casamento. Tocava seu violão com a desfaçatez de um office-boy fazendo embaixadinhas na Praça Tiradentes, ou seja, para Compay tocar violão era um talento que todos deveriam ter, nada mais que obrigação - senão como conquistar as mulheres?
Compay Segundo foi uma homenagem que a Natureza prestou às boas coisas da vida: o gostar de música, gostar de mulher, gostar da boa bebida, dos bons amigos e da felicidade de tocar.
Vou me lembrar sempre de que mandei fazer minhas alianças de noivado no dia em que Compay se foi. Que ele nos abençoe, a todos.

Sem contato de mãos humanas
Acho que a paranóia toda começou quando algumas embalagens começaram a vir com essa frase do título escrita em cima, como forma até de encarecer o produto. Afinal, máquinas não tinham vírus ou bactérias como os seres humanos de mãos sujas. Nada como a tecnologia para evitar que algo nojento como uma unha ou cabelo apareça no meio de seus cookies ou amendoins. Tudo bem que volta e meia rolavam boatos de que ossos adornavam o interior de garrafas de coca-colas, mas, ora, tudo tem seu preço.
Pensei nessas coisas quando li outro dia, há dois meses que a Leiteria Silvestre estava indo para o vinagre. E parece que foi. Na verdade, já tinha virado Café Silvestre, mas a casa abriu em 1908 como leiteria.
Volta e meia quando alguém se estressava no centro da cidade, era comum sair um pouco do século e entrar para a história, parando para fazer um lanche na Silvestre (que ainda leva nome da galeria que ilumina seu lar).
O Globo publicou matéria dizendo que "a insegurança fechava a Leiteria Silvestre", atribuindo o fechamento às brigas entre guardas municipais e camelôs.
Balela.
No fim da matéria, o gerente, Armando, de 65 anos, dá o serviço:
- As pessoas não têm mais tempo para saborear um bom lanche, de esperar o atendimento do garçom. Todo mundo vive com pressa, sai comendo sanduíche na rua. Na Silvestre, as pessoas não eram apenas clientes, eram amigas - lembra.
Sei que estou chovendo no molhado. Mas é nessas horas que até vejo com bons olhos as decisões radicais de Luis Edmundo, o único jornalista do Brasil que não tem celular (em breve estarei me juntando a ele) e provavelmente o único dono de computador que considera CD-ROM uma "babaquice". "Serve para colocar copos, nada mais", ataca o xiita anti-tecno.
Quando vi hoje no caderno de informática que os McDonald's (que, por si só, já são um convite à impessoalidade digna de um bando de coveiros) vão usar pedidos informatizados, sem necessidade de atendimento humano, já senti um calafrio.
A mesma nóia acontece na hora de ir ao cinema - locais onde passei parte de minha infância como o Copacabana, o Ópera, o Coral, o Scala, o Largo do Machado 1 e 2, vão dando lugar a igrejas, lojas, academias de ginásticas (porra, há lugar mais escroto do que uma academia de ginástica?), porque os Cinemarks da vida substituem tudo. Os Cinemarks de veludo e Combo de pipoca substituem o velho cinema de rua, de onde você sai hipnotizado e dá de cara com a luz diferente da que estava quando você entrou, dá de cara com a cidade.
A vida está mudando. Mas acho que neguinho se precipita muito ao dizer que tudo está mudando para melhor com a tecnologia. É cedo para dizer.

13 julho, 2003

Tem, mas acabou
Estamos de volta, após quase três meses de paralisação. Pensei bem em tudo e decidi retornar com os comments - ou seja, se alguém quiser ficar me esculhambando, fique à vontade. Vale mais me comunicar com dezenas de amigos com quem eu nem sempre consigo me comunicar, até mesmo amigos no exterior, do que ficar esquentando a cabeça com uma rapaziada que só está a fim de encher o saco via comments.
O nome do blog novo? Pois é, resolvi colocar a frase que na minha opinião é a síntese de um estilo de vida. Você procura, acha o lugar certo, tem o dinheiro e a possibilidade, sabe que é só ali, mas ouve a frase, "Tem, mas acabou". Chamemos o sentimento da frase de "Neo-pessimismo". Um pessimismo de quem tem certeza de que a luz no fim do túnel só pode ser mesmo um trem vindo em sentido contrário.
É isso aí. Estamos aí enchendo o saco novamente.
Divirtam-se, se é que isso é possível.

ps - Continuem prestigiando o Nove Meses, meu blog sobre o Campeonato Brasileiro, e o RH Negativo.

Gente sacana
Minha namorada, Marcele, perdeu o emprego. Na empresa dela, uma empresa de clipping (se alguém quiser saber qual, me manda um email que eu digo, só não vou publicar porque pode prejudicar Marcele), a gerente queria que ela assinasse um contrato afirmando que não prestava expediente aos domingos. Ela questionou, e por isso acabou demitida.
Não vale nem a pena chorar por causa disso, já que a muquiranagem do salário causava horror. Mas o que deixa qualquer um absolutamente puto da vida é saber que três dias antes da demissão o "good cop" (a chefe boazinha acima da gerente mas que finge não saber que a gerente é uma filha da puta) pediu que Marcele aprendesse novas técnicas de publicação no site. Ou seja, não havia intenção de mandar embora, foi tão-somente por causa do contrato.
Neguinho paga mal e ainda quer que o funcionário minta no contrato. Marcele trabalhava fins de semana alternados, sem folgas para compensar, ou seja, ela trabalhava sempre doze dias seguidos. Durante três meses.
Aí, volta e meia a gente pára pra discutir a marginalidade, a insegurança, a violência, etc. Marcele passou por isso mas saiu por cima, não precisa (por enquanto) do emprego, tem casa para morar. Agora, fico pensando no quanto empresários e patrões fazem coisas semelhantes por aí, pagando mal e atuando como escravagista. Aí ninguém entende porque um sujeito vai para o crime. Ninguém quer ouvir o cara (que viu pai e mãe trabalharam 30 anos para porra nenhuma) dizer a frase que incomoda: o crime compensa.
Eu bem sei que nenhum crime compensa. Mas gostaria de que nós pudéssemos voltar a dizer isso com mais convicção e também voltar a dizer que o trabalho compensa.
Quanto à empresa de clipping, só desejo que a gerente leve em breve um soco nos cornos de algum estagiário de saco cheio. Mais detalhes em breve no RH Negativo.

Brecht com couve e arroz
Tenho simpatia pela causa dos estudantes secundaristas, que brigam pelo direito de terem o passe livre. Sim, os empresários de ônibus ganham os tubos há anos nessa cidade, oferecendo um serviço ruim, pagando mal pacas seus funcionários e obtendo sempre reajustes gordíssimos dos prefeitos - depois de, é claro, contribuir para a eleição deles nas campanhas.
Agora inventaram a catraca invertida, nitidamente com o objetivo de limitar o número de estudantes e idosos a viajar gratuitamente. Mandam o motorista só deixar entrar pela frente, neguinho lota o local e aí quem está no ponto é obrigado a esperar o próximo. Alguns empresários ainda complementam o serviço, colocando menos ônibus nos horários de pico - acontece na empresa que faz as linhas 511 e 512.
Agora, reportagem em O Globo mostra os estudantes envergando mais uma vez aquele texto "O analfabeto político", atribuído a Bertolt Brecht. Não que eu duvide. Mas bem que eu gostaria de bater um papo com o tradutor.
"Não sabe que da sua ignorância política nasce o menor abandonado". Diacho, já no período até 1956, quando morreu Brecht, já era possível ver o problema do "menor abandonado" nas ruas de Augsburg, na Bavária, onde nasceu o dramaturgo alemão?
Olhando mais atentamente ao cartaz dos estudantes na foto de O Globo, dá para ler "ele não sabe que o custo (...) do feijão, da farinha, depende de, etc".
Brecht devorava feijões com farinha enquanto descia canecos gigantescos de cerveja alemã? Talvez para acompanhar salsichões e chucrutes? Fico então indignado com esse povo do Brasil que vai morar no exterior e fica dizendo que tem saudade de feijão - porra, até o Brecht conseguia fácil, caramba.

10 estações
Nesses dias em que a auto-estima (aliada à miopia) do carioca fica em alta por causa da vitória sobre São Paulo, tive a oportunidade de ver mais uma vez como essa cidade aqui é um abandono absoluto.
Fui com Marcele ao aniversário de uma amiga dela de muitos anos, em Irajá. Com a absoluta contenção de despesas a que me entrego inutilmente há meses (tento fazer sobrar dinheiro, mas quem tem o salário já abatido completamente na luta contra a inflação não tem chances), fui de Metrô , a partir da Estação Siqueira Campos. Saltando na estação Estácio, pegando a linha 2, e seguindo por São Cristóvão, Maracanã, Triagem, Maria da Graça, Del Castilho, Inhaúma, Tomás Coelho, Engenho da Rainha,Vicente de Carvalho, até Irajá.
Minha namorada, criada na Zona Norte, não se espanta tanto. Mas eu ainda fico impressionado com o desequilíbrio, mesmo com anos trabalhando em Geral nos jornais cariocas.
Ao longo de 25 minutos de viagem (ida e volta) dentro do ônibus 712, que peguei na saída do metrô e na volta, não vi sequer um PM ou guarda municipal. Vi ruas completamente às escuras. Na volta, pegamos o ônibus às 19h30 em um ponto onde ele fica parado (é circular) e havia uns sete funkeiros berrando palavras de (des) ordem dentro do ônibus. Naquele instante, percebi que os caras berram daquele jeito simplesmente porque podem fazer absolutamente tudo o que quiserem. Tudo, pois têm a certeza da impunidade.
Curioso é que as pessoas que tomam conta da Zona Sul rica devem morar, em sua quase totalidade, na Zona Norte.
E assim seguimos, os cariocas, orgulhosos dessa cidade “linda” que ganhou o direito de tentar sediar Jogos Olímpicos, mas que tem uma área decente que se pode fazer de bicicleta. Orgulho? Tenho orgulho da minha terra, não da minha cidade. Tenho orgulho do Rio de Janeiro, porque é a terra de Vinícius de Morais, de Tom Jobim, de Zico, de Lima Barreto, de Machado de Assis, de belezas naturais, de mar e montanha, das esquinas – mas isso é a minha terra, sim, na qual beleza é fundamental.
Agora, a cidade, o estado, ambos entregues a desgovernos sucessivos, são apenas atestados de nossa impotência, de nosso apreço pela desigualdade.
O Rio, quem diria, não acaba em Irajá, vai mais adiante, vai até a Pavuna. Eu saltei antes, mas às vezes tenho a impressão de que os nossos governos sequer pegaram a linha 2 - como disse Jânio Quadros sobre Fernando Henrique em 1985, “este senhor jamais esteve em Sapopemba”. Eu diria: nossos governantes desde 1982 parece que jamais estiveram no Irajá.

Desejo de Lotar
A princípio, com um título desses, o leitor ficaria em dúvida se esse é um post sobre gordos em churrascarias rodízio ou sonhos eróticos homossexuais com o parceiro do Mandrake.
Na verdade, faço valer aqui a principal função, na minha opinião, de toda essa história de web logs: o desabafo.
Se algum sociólogo estiver sem nada para fazer, sugiro o estudo de um tema ainda mal explorado em nossas bancas universitárias: o desejo de lotar.
Partamos de uma premissa simples: todos nós sabemos que ir ao cinema no sábado à noite é completamente inviável. Hordas de adolescentes devoradores de pipocas, casais com dez anos de casados, senhoras de meia-idade, jovens, crianças em pencas, enfim, multidões invadem os cinemas, principalmente os detestáveis Cinemarks, onde ninguém tem alma, como em WestWorld.
O que eu pensei nesse sábado passado, quando passei com ela no Botafogo Escada Shopping para pateticamente tentar uma ida ao cinema foi o seguinte: se todos sabem que ir ao cinema no sábado à noite implica em um sério risco de ver o filme sentado no carpete, por que diabos, afinal, tanta gente vai?
Seria muito louco eu desejar que todos pensassem ao mesmo tempo, "É, cinema sábado à noite é impossível', e de repente ninguém fosse, e ficasse vazio? Sim, claro, seria. Mas não seria de todo louco esperar que no mínimo o bom senso fosse senso comum, e pelo menos as filas não dessem voltas e mais voltas na praça de alimentação.
Enfim, vou parar por aqui, senão vai ficar parecendo blog de patricinha, papo de reclamar de shopping. Mas que para mim existe uma estranha compulsão humana de ir a um lugar lotado, ah, isso deve ter sim.

Trabalhamos com esse produto, sim
Você vai, procura um produto de necessidade urgente, entra na loja, mas n?o obtém. O vendedor diz que a loja até trabalha com ele. Qual a frase que vem à cabeça?
Aguarde, vem a? o novo blog, mas no mesmo endereço.